ISSO PRECISA MUDAR!

O Fórum Animal encaminhou ofício às emissoras rede globo e tv record referente ao uso de animais em programas das emissoras. No programa “No limite” da Globo, animais foram ingeridos vivos e no programa da Record, outros animais foram colocados em caixas de acrílico para serem manipulados por pessoas vedadas. Pedimos que as emissoras reconsiderem a prática de uso de animais em programas. 

Em uma prova do  programa “No Limite” da Rede Globo veiculado na noite do dia 13 de julho de 2021, o sucesso dos candidatos dependia da ingestão de animais vivos, como larvas de besouro e baratas de Madagascar, além de olhos de cabra – essa última uma tentativa de remeter a primeira e mais famosa edição do programa realizada no início dos anos 2000. E o que mudou de lá para cá? A sociedade. Avançamos no conhecimento científico sobre a senciência animal e no  reconhecimento do direito dos animais a uma vida digna e sem sofrimento. Também, avançamos em valores éticos que permitem identificar práticas que nada tem de engraçadas e apenas reproduzem violência e humilhação. O mesmo acontecia com “minorias” e grupos menos privilegiados da sociedade que muitas vezes eram usados como alívio cômico para os detentores de maior poder. Isso não é mais social e moralmente aceito.

Um dos quadros do programa “Power Couple” apresentou no final do mês de junho uma prova em que as participantes precisavam identificar pelo tato e às cegas o conteúdo de diferentes caixas de acrílico. A maioria delas continha animais vivos, como cobra, coelho, lagarto, ratos e ouriços. O fato das pessoas estarem vedadas, conferia obviamente um risco adicional aos animais tratados como objetos por pessoas que estavam claramente assustadas e com medo do “conteúdo” das caixas. Por mais que a  apresentadora tenha orientado a ter “delicadeza” ao manipular os animais, obviamente não foi o que aconteceu. Além disso, é preciso considerar que os animais “usados” como parte do show foram obtidos e mantidos de alguma forma, o que provavelmente implica confinamento, transporte e uma série de eventos e situações estressantes para que os animais estivessem disponíveis para o “uso” pelos programas televisivos mencionados.

A senciência é um atributo de animais com sistema nervoso e estruturas capazes de processar experiências de forma consciente, o que inclui todos os vertebrados e diversos invertebrados como cefalópodes (ex. polvos e lulas). A presença deste atributo nos permite afirmar que os animais que o possuem podem ser considerados conscientes. Os insetos e aracnídeos representam o maior número de indivíduos na natureza, com níveis de desenvolvimento fisiológico e comportamental tão diversos que ainda não conhecemos o suficiente para afirmar qual o grau de senciência envolvido em cada espécie. Entretanto, estudos sobre comportamento de abelhas, por exemplo,sugerem que elas são capazes de ter experiências conscientes e há numerosos indícios de que outras espécies de invertebrados também sejam. A grande possibilidade disso somada ao fato de os animais serem usados para um fim tão fútil e desnecessário  são razões suficientes para reconsiderar essa conduta.

Além disso, frisamos a importância de colocarmos em prática nossa capacidade de nos desenvolvermos moralmente, buscando interações mais justas com o outro, seja humano ou não-humano. Trata-se também de uma discussão ética indispensável para o futuro do entretenimento. Para  algo ser divertido é preciso que todos os participantes estejam de acordo e compartilhem de experiências positivas. Se as emissoras de TV não consideram o interesse dos animais em seus planejamentos e criações, ao menos deveriam considerar o interesse dos espectadores. Apesar de muitos dos espectadores dos programas não fazerem ou não exporem questionamentos aprofundados sobre o uso de animais em entretenimento, temos certeza de que outros o fazem e deixarão em breve de consumir seus produtos. As emissoras precisam assumir seu compromisso e responsabilidade social.

 A incapacidade de enxergar que esses atos banalizam a violência, promovem humilhação e até mesmo alimentam o sadismo de alguns pode ter consequências maiores também para as relações humanas. Essa ridicularização do outro e o descompasso com os anseios da sociedade que avança em reconhecer que os animais têm interesse em não sofrer não parecem ser maneiras  “modernas” e muito menos engraçadas de tentar entreter o público. Ao invés de sucesso e audiência, tais decisões questionáveis podem causar não só polêmicas e engajamento em redes sociais, como também responsabilização dos envolvidos. 

Esperamos que os responsáveis pelos setores de criação e desenvolvimento de programas se conectem aos princípios da ética animal e considerem não utilizar mais animais em suas produções. Estamos abertos ao diálogo e nos disponibilizamos para maiores esclarecimentos sobre os apontamentos aqui expostos, se necessário.


texto: Haiuly Viana

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