Introdução de espécies exóticas: riscos e responsabilidades – O caso dos hipopótamos adquiridos por Pablo Escobar

Por Haiuly Viana, Gerente Técnica do Fórum Animal

A excentricidade do zoológico particular de Pablo Escobar

Em 1979, Pablo Escobar, narcotraficante colombiano estabeleceu uma espécie de zoológico particular em uma de suas propriedades, conhecida como Hacienda Nápoles. Entre as espécies adquiridas estavam cangurus, elefantes, girafas e hipopótamos. Para que os animais chegassem até a Colômbia, Escobar fretava aviões cargueiros para transportá-los em voos clandestinos até seus hangares no aeroporto de Medellín, depois disso o próximo destino era seu zoológico particular.

Depois que Escobar foi perseguido e morto pela polícia, em 1993, a maior parte dos animais da Hacienda foi apreendida e remanejada para zoológicos da Colômbia e de outros países. Outros vieram a óbito. Ao todo, o traficante tinha cerca de 1.200 animais.

O caso dos hipopótamos 

Os hipopótamos, na época, 4 indivíduos adquiridos ilegalmente da África foram abandonados no rancho. Estes animais, ao longo do tempo, escaparam da propriedade e se estabeleceram em rios e lagos ao redor da propriedade.  

Em 2021, estimativas sugeriam que a população de hipopótamos tinha aumentado de 35 para 80 exemplares em um período de 8 anos. Entretanto, atualmente estima-se que a população tenha cerca de 120 indivíduos vivendo no local, criando um enorme desafio de manejo desta população por parte das autoridades colombianas.

Em 2023, o governo colombiano declarou oficialmente a espécie como exótica e  invasora e, com isso, estabeleceu um prazo para que as autoridades legais do país apresentarem um plano de manejo da espécie.

Este caso é certamente emblemático para debater os impactos da introdução de espécies exóticas na biodiversidade local, as responsabilidades e os desafios éticos para o manejo da espécie, considerando os impactos ambientais gerados, seus próprios interesses e também a dos demais indivíduos impactados com sua presença.

Segundo especialistas, os hipopótamos na Colômbia, não só competem por alimento e espaço, como alteram as características dos rios e lagos, como pH da água, profundidade e quantidade de matéria orgânica, por exemplo.

Cientistas consideram que o manejo desta espécie pode ser um dos maiores desafios entre os casos de espécies exóticas invasoras do mundo e discutem as possibilidades.

O que é uma espécie invasora

Uma espécie animal exótica invasora é um grupo de animais que não tem ocorrência natural em um determinado local e que foi introduzida, em grande parte, por ações humanas. São animais que podem competir com recursos naturais com outras espécies nativas e assim ameaçar a sobrevivência desta última, além de poder causar outros impactos ambientais, como destruição de vegetação nativa ou lavouras. Como exemplos destes grupos de animais no Brasil podemos citar o Javali (Sus scrofa) e o caracol gigante africano (Achatina fulica).

Possíveis soluções para o caso

Uma resolução para esta situação, se é que já existe, demanda estudos técnicos, análises ambientais e um enorme investimento econômico e de pessoal especializado, além de mobilização de autoridades nacionais e internacionais. Entre as estratégias discutidas estão a castração química, o abate dos animais, a captura e confinamento dos animais. Embora a castração química tenha sido considerada e realizada, os resultados não foram bem sucedidos. A técnica envolve alto custo e a necessidade de doses repetidas para ter um efeito prolongado sobre a reprodução. Além disso, não impede outros problemas decorrentes da presença da espécie no território.

A proposta do abate dos hipopótamos é uma medida extrema e foi muito criticada por parte da população. Obviamente a morte dos animais não é uma solução aceitável e muito menos ética. Não se pode condenar animais que foram vítimas da excentricidade humana e da ineficiência das autoridades – que tanto não impediram a importação, como não agiram prontamente para definir um plano de ação ético e impedir sua adaptação ao ambiente e reprodução descontrolada.

Em 2021, o caso foi judicializado em corte internacional. Uma entidade de proteção animal (Legal Defense Fund) entrou com uma ação na corte americana questionando os abates e a esterilização química. E em decisão judicial, os animais foram considerados como pessoas jurídicas, algo inédito no país.

Outra medida estudada é o envio de alguns indivíduos para santuários de vida selvagem no México e Índia. Isso demanda um aporte financeiro e logístico intenso, uma vez que estes animais podem pesar de 2 a 3 toneladas cada. Em março deste ano foi divulgado um plano para transferir cerca de 70 indivíduos que serão transportados por via aérea. O processo ainda aguarda as licenças necessárias para a viagem. 

Ações individuais irresponsáveis gerando danos para a coletividade

Esse é um exemplo de como ações individuais irresponsáveis geram danos incalculáveis para o coletivo. Neste caso, animais humanos e não humanos, além do meio ambiente foram impactados por uma ação individual e inconsequente. E este é apenas um caso, que teve grande repercussão na mídia. Entretanto, há inúmeras outras intervenções humanas que são um risco para os animais e para o meio ambiente. 

Introdução de espécies para  entretenimento, reprodução ou mesmo para compor coleções pessoais desrespeitam a dignidade animal e também demonstram um completo descompromisso com o meio ambiente e com os demais animais nativos do país.

A ausência de uma conscientização pública, aliada a falta de tipificação destas práticas como um delito grave prejudica toda a sociedade e gera impunidade. E para variar, as maiores vítimas, no caso os animais, são sempre as maiores penalizadas. 

Referência

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