Tragédia em zoológico da Bélgica: uma reflexão sobre confinamento, estresse e busca por soluções

No início de março de 2024, o  Zoológico do Bellewaerde Park, um parque temático na Bélgica, tornou-se palco de uma tragédia que ecoou internacionalmente. Durante um momento crucial de adaptação entre leões em cativeiro, o leão que estava sendo apresentado às fêmeas reagiu com inesperada violência e arrancou a garganta de uma das leoas, resultando em sua morte. Este evento chocante não só provocou comoção, mas também levantou questões profundas sobre o confinamento de animais selvagens em zoológicos e as implicações de tentativas de reprodução em cativeiro.

O caso em questão aconteceu especificamente no contexto de um programa de reprodução dos leões em cativeiro. A justificativa é que a espécie está vulnerável à extinção e que, portanto, eventos de reprodução em cativeiro fazem parte dos esforços de conservação da espécie. Entretanto, mesmo com todo o protocolo técnico estabelecido para  um programa de reprodução cativeiro, a tragédia ainda assim não pôde ser evitada. Isso evidencia uma verdade incômoda: os animais silvestres em cativeiro estão sujeitos a um estresse constante, independentemente da qualidade do ambiente em que vivem.

Este acidente não é isolado. Na verdade, ataques e brigas entre animais silvestres em confinamento provavelmente são mais comuns do que se imagina. Infelizmente, não encontramos uma estimativa concreta, mas arriscamos presumir que, apenas no último ano, tenham ocorrido centenas de casos semelhantes em zoológicos ao redor do mundo, com menor ou maior grau de gravidade para os animais ou até mesmo seres humanos envolvidos.

A falsa noção de controle, muitas vezes associada aos protocolos rigorosos dos estabelecimentos, é desafiada pela imprevisibilidade do comportamento animal e pelas tensões resultantes do confinamento. Foi notável que até mesmo os funcionários do estabelecimento ficaram surpresos com a situação, demonstrando que mesmo quem está acostumado com os animais e com o manejo não tem o controle da situação. Aqui é importante ressaltar que o leão e a leoa envolvidos na tragédia já viviam em confinamento em zoológicos antes de se encontrarem. Até onde apuramos, o leão continuará no parque e provavelmente será submetido novamente ao programa de reprodução em cativeiro no futuro.

Ao comentar esse caso, queremos trazer a perspectiva maior da problemática que envolve a vida silvestre em cativeiro. É importante pensarmos sobre isso, porque pode ser que esse tipo de evento não tenha necessariamente uma solução, visto que o ser humano jamais terá o controle absoluto do comportamento dos animais. Isso precisa ser previsto e ponderado nas decisões de manter ou não programas de manejo e conservação por reprodução em cativeiro. Fica aqui, portanto, o alerta sobre os riscos que podem existir quando submetemos os animais a esse tipo de condição de vida.

Thayara Nadal, Médica Veterinária no projeto Vida Silvestre, Vida livre do Fórum Animal.

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